19 de setembro de 2006

Plano Perfeito

Existem certas coisas que não modificam muito com o tempo. No meu caso, trata-se apenas de uma inofensiva mania, como fazer um pequeno festival pessoal de filmes, a escolha de ser anual é aleatória não tem sentido cabalístico e etc.
Há algum tempo, meses, digo, queria ver o "Plano Perfeito" do Spike Lee. Coincidiu com uma revisão de filmes dele, "Clockers", "Febre da Selva", "Faça a coisa certa", etc. E nessa retrospctiva de seus me vem a sensação de que Spike lee faz filmes como quem compõe uma peça de jazz. Simplesmente qualquer tipo de improviso pode acontecer, assim como o improviso de repente transforma-se em uma composição melódica dinâmica, de estrutura aberta em que se misturam a comédia, o drama, a investigação, a inteligência a contra-inteligência. Diálogo de sons e de imagens em ritmo, cadências crescentes-decrescentes, passo, contrapasso. O constructo dos seus personagens parecendo a surdina do saxofone soando. Nada é previsível em seu compósito, no lugar de onde soam as suas notas, Nova York, uma cidade que excluiu do seu dicionário a palavra imprevisto e se armou de toda a tecnologia capaz para expurgar o improviso, como por exemplo, um assalto a um renomado banco. É um insulto.

Spike Lee colocou seu dedo na ferida, jogou com classe seu avião nas torres gêmeas. Ora, em segundos o local do assalto está cercado da mais alta tecnologia disponível; todas as inteligências policiais são acionadas; tecnologia de ponta comprada no site da amazon.com, como diz a policial para Denzel Washington, "um gravador digital, pode gravar até 30 minutos de conversa...compra-se na Amazon, nem é tão caro".

Mesmo com dois filmes sobre o 11 de setembro em vias de estrear, considero o filme de Spike lee, como o que melhor fala sobre o 11 de setembro sem ao menos mencionar o evento. Caso alguém insista, poderíamos dizer que há alusões. Esparsas.

E em que lugar está exatamente a menção a 11 de setembro? Em nenhum lugar. Em todo lugar. Na tecnologia comprada em mercados livres de internet, na simulação de uma ação de segurança efetiva, competente...assalta-se um banco com armas de brinquedo nem é necessário sujar as mãos, basta apenas manipular o terror instaurado;pura simulação -"Saírei pela porta da frente!"- diz Clive Owen ao detetive. Para que serve essa tecnologia a serviço da segurança pública se ela não consegue impedir que um dos maiores bancos de Nova York seja invadido, que sejam feitos reféns...e para quê tudo isso se os assaltantes não levam um único níquel? Em primeiro o efeito regozijo da polícia, ou no caso, truque cortina-de-fumaça do diretor: "impedimos um grande roubo, ao invadir o banco com a nosso regimento."

"-temos todo tempo do mundo"

Quem planeja todas as situações e realiza um assalto grandioso com armas de brinquedo, compreende que não há riscos, sabe que todo esse aparato de segurança também é de brinquedo.Basta simular a posse de uma tecnologia igual ou melhor, manipular as reações causadas pela infatigável sensação de terror.

Por que não um assalto de brinquedo, para uma polícia que brinca de "carro-comando"?
Alguém já percebeu a insistência, às vezes quase irritante do fundo sonoro nos filmes de Spike Lee? E vejam, não é simplesmente uma trilha sonora, é a comprovação de que o improviso pode ser orquestrado em cadência singular nas imagens. Hard bepop.

2 comentários:

Biajoni disse...

ótemo, achei super!
o brigatti comparou com V de Vingança.
:>)

Anônimo disse...

Realmente, Bia, não fiz imediatamente o link com o V de vingança,; talvez no inesperado de algumas situações, a reviravolta, o tom ligeiramente subversivo sem estar atrelado a partidarismos! ;)