
Havia muito que se habituara. Como as teias que não assustam mais quando nos deparamos com elas atrás dos móveis. Se havia sentido rítmico naquelas vidas, faltaram em não lhe dizer…já havia passado anos desde dia em que encontrara a primeira teia atrás de um móvel velho….e dali em diante não mais sentira repulsa, tampouco surpresa; as teias iam se acoplando enquanto tentava envelhecer sem se perturbar; envelhecer sem que pendesse para uma loucura miserável, pois era assim que todos esperavam. Que ficassem as teias. Que o costume do tecido permanecesse. Roto.
Mas não havia muito a fazer. Mesmo se houvesse um outro destino mais nobre do que esperar à porta. Se advogasse causas que salvassem a dignidade dos outros e que engrandecessem decerto sua vaidade (e qual outro motivo haveria senão a própria vaidade), ainda assim não deixaria de usar o costume roto e ainda vestiria uma máscara. Esperaria à porta aquele dia. Passaria lenta pelo corredor até alcançar o corrimão da escada, não sorriria; era algo que o tempo fazia dispensar. Como uma vantagem. Falaria calmamente o que havia feito, tentaria não pensar na inutilidade do gesto de carinho, tentaria não pensar na imposição daquela figura à sua volta, ali ao seu lado, tentando substituir-lhe a vontade, dividí-la na sua atenção até que se encerrasse na calmaria da tv. Era hora do café. Lembrava-se de ter sempre pouco pó, pois é sempre necessário ter um alíbi apropriado para sair à rua àquela hora. Precisava de uma seqüência astuta de gestos: a concentração dele, o balançar de cabeça concordando com seu motivo para sair sem tirar os olhos da plácida tv.
Abria a porta que dava para a escada.
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