26 de março de 2009

15 step

How come I end up where I started?
How come I end up where I went wrong
“São quinze passos para começar, são quinze passos apenas, para que chegue até ti a ventania que te carregará para longe”, tinha 11 anos quando escutei meu avô me sussurrar isso. Estava deitado em uma rede quando vi que algo estava errado, vi que sentia dores, mas ele me pediu para não chamar ninguém e me disse aquilo. Logo depois foi a correria, a mãe e tias, gritando “ataque caardíaco” e contrastando com a cena os olhos azuis e macios do meu avô me olhando com um um sorriso leve. Ele se abandonava. Era o que ele estava me dizendo sem uma palavra. Meu avô era um comerciante, não um escritor.
Durante algumas semanas quiseram me imputar uma culpa por não ter chamado ninguém quando percebi que algo não ia bem. Mas carreguei de silêncio as minhas reações aos murmúrios feitos atrás das portas, aos berros, e mesmo com ódio aberto. Comecei a carregar comigo uma marcha de desabrigados, um colo sujo, feito de emoções torpes ou adestradas, de uma dureza sem par.
Satisfazia o protocolo familiar do esquecimento da morte, o luto, quando me sobreveio mais uma morte, e dessa não falo, por que nela também não conheci culpa, mas de novo fui testemunha.
Apesar de acontecimentos adversos, era uma criança normal que pensava demais na morte, sem querer morrer, e reinterpreteva cem vezes o que meu avô disse enquanto morria, e não convivia com nada que pudesse me envolver realmente.
Eu crescia, e comecei, à medida que esquecia o que meu avô havia dito, a tomar partido, eu já conseguia ter meu pai e minha mãe, eu tinha irmãos, e frequentadores. Eu sabia o que seria quando tinha dezesseis, por deus, eu já estava morrendo. 
E um dia, nove anos depois, assim como qualquer outro dia, tomei o café, de cenho franzido, sem mencionar nada do que me alimentava ou pensava, e escutando brevemente a voz de meu pai repetindo que havia mudado, pude ter tempo de lamentar minha mudez adulta, que não podia se desculpar sem que algo por dentro se decepasse. Pensei: foram os 15 passos.
Eles de nada sabiam, não desconfiavam, mas se soubessem, se ali falasse, apenas espicaçaria a vontade deles de me demover de tudo. Eu queria deixar a minha mãe lavando a louça, meu pai mexendo o relógio parado há dias, sentia que se dali saísse e voltasse a qualquer hora, encontraria a mesma cena, como se ali fosse um museu de cêra. 
Saí pela porta, distraída, fui até a rodoviária, paguei uma passagem, a mais cara, para qualquer lugar que o vendedor escolheu enquanto me olhava como se fosse louca, desci em uma grande cidade e comecei a trabalhar em um bar. Eu não estava morrendo, como pensava aos dezesseis, estava procurando manter meus olhos fixos no brilho.
O brilho para mim era ter descoberto que meu avô não tinha me dado um aviso ou uma sentença, ele apenas sabia que um dia o que me levaria embora seria um sopetão, uma ventania de promessas -que sempre nos acometem- quando percebesse que me enganara quanto a estar morrendo, quando de mim saísse o cheiro de cêra, quando me demitisse do cenário da família. Em quinze passos refaço a vida inteira... e não sabia se teria mais 15. Havia me apaixonado sem saber se era correspondida, e a vida era uma amante vadia, mas me espreitava a todo momento.
Começava uma vida de trabalho, e o trabalho era uma rotina necessária, havia períodos de folga curtas, e quando arranjei mais um emprego à noite, restavam idas solitárias ao cinema e às praias próximas. Andava como se todos estivessem atrás de mim, em alguns momentos, via setas vermelhas saindo de alguns olhos apontando para diversos lugares, mas em nenhum deles eu estava. Eu não permanecia na gerência de afetos pendentes ou mesmo permanentes. Eram apenas quinze passos para refazer a vida inteira... Os anos iam passando e eu já havia contado sessenta.

2 comentários:

Michelle Robert disse...

quanto tempo livre pra montar esses sites inúteis.

Anônimo disse...
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